segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Herança

Andei pensando nessa coisa incerta que é a vida e em como ela foge fácil de nossas mãos, deixando planos, ideias, sonhos e feitos incompletos pelo espaço.

Imaginei como seria se você soubesse o dia do seu fim com antecedência. Presumo que o sentimento não se compararia à expectativa de um parto, de uma vida por vir, algo como a luz surgindo.

Vida que vai e vem. Todos parados em uma estação, aguardando a vida e a morte, embora silenciosamente.

Uma das facetas mais admiráveis do ser humano é conviver com a certeza da morte e não se desesperar. Sempre penso nisso.

Viver com a certeza cruel de só se viver uma vez. Uma única e inevitável vez.

O cavalo celado, que com rapidez só aparece em tua porta uma vez. A vida é essa dádiva, que muitas vezes se assemelha a um castigo.

A vida, que nos é dada sem escolha. Cada um vai compondo acordes nas linhas dessa partitura.

Já dizia Milan Kundera, "a vida humana acontece só uma vez, e não poderemos jamais verificar qual seria a boa ou a má decisão, porque, em todas as situações, só podemos decidir uma vez. Não nos são dadas uma primeira, segunda, terceira ou quarta chance para que possamos comparar decisões diferentes".

Somos estreantes em um show único que só acontece sem ensaio.

Kundera vai ainda mais longe e afirma que "o homem, porque não tem senão uma vida, não tem nenhuma possibilidade de verificar a hipótese através de experimentos, de maneira que não saberá nunca se errou ou acertou ao obedecer a um sentimento. Tudo é vivido pela primeira vez e sem preparação. Como se um ator entrasse em cena sem nunca ter ensaiado".

"Uma vez não conta, uma vez é nunca. Não poder viver senão uma vida é como não viver nunca".

Recebemos como herança da vida o mal de morrer. Temos como consolo o que pode ser feito aqui enquanto houver ar para respirar, enquanto ainda restar forçar e batidas de coração.

Homens simples ou não, caminhando pelo mundo. Sendo imortais mesmo após sua morte. Carregando a herança serena e severa de só se viver uma vez.

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